sábado, 13 de junho de 2009

Pressa



Pit stop pro almoço
Não troca os pneus
Nem as esperanças
Apenas poucas palavras

Mastiga-se poucos feijões
Não estão quente os pneus
Nem a esperança
O tempo acabou, também as palavras

A corrida continua
Agora na contramão da história
Fazendo do nosso lixo
Sua fortuna

Ultrapassagem perigosa
Ultrapassou o limite de peso
Ultraseven
Homem de sete cavalos.

Rogério Cabeça

Contrastes



Quadradinhos de sonhos vestem a calçada,
Servem de descanso para os pés cansados.
De pneu novo, o carrinho manhoso é bem vaidoso,
Deixa marcas profundas em mais uma vida,
Exibindo as ranhuras e a geometria novinha
De sua estrutura.
Os pés maltratados,
Largados sobre velhos chinelos,
Repousam o corpo
De um ser humano.
E assim segue a vida,
Nesta mesma batida...
Vida largada? Sonhos desfeitos?
Descansa, reanima, e segue na lida.

Sueli R. S. Simão

Recicla-se



Na aventura da vida
Todos têm direito ao sol,
Aquilo que jogas no lixo
Vira ouro em outras mãos.

Cobres, latinhas, papelão,
Pets, plásticos e ferro.
Em novos produtos transformam
E embalam os sonhos de alguém.

Nesta ciranda da vida,
É cíclico reciclar.
Gira o mundo dos restos
Novo volta a ficar.

E os catadores de sonhos
Fazem do velho, o novo,
Separam, carregam, reciclam
E vão transformando em ouro.

Alumínio vira alimento
Papel velho em vestido novo
Cobre vira sustento
E vão embalando os sonhos.

Nesta roda da vida
Tudo é reciclável
A vida por outras vidas
Até a morte e bem vinda.

É triste esta afirmação
Mas a realidade é dura
Para salvar uma vida
Reciclam-se outras vidas...

Sueli R. S. Simão

Vigiado por Deus



Tá com pressa?
Passa por cima.
A fogaça I tá no ponto.
Ele espera e se anima.
Com o carrinho lotado, continua reciclando
De esquina em esquina ele para e vai tudo selecionando.
Separa tudo que serve, não se importando com que:
Garrafas pets aos montes. Papelão, meu Deus!!! Nem se fala.
Aquelas latinhas então... Cuidaaado!
Com o ladrão,
Mas o aviso na carroça ensina:
“Vigiado por Deus”
Fique em paz.
E assim ele segue a rotina,
Girando o mundo a reciclar.

Sueli R. S. Simão

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Testamento



No dia que eu me for embora desse mundo
já vi que eu vou do mesmo jeito que eu cheguei
sem nada nem pra mim nem pra dar pra ninguém
só se for esse carrinho
que é que nem se fosse eu mesmo
de caçamba roda e puxador
e mais o que fazer, que isso tem.
Saudade vai dar é do pessoal da rua
na hora de parar pra fumar um cigarro
e a cidade que eu já fui pra tudo que é lado
de chinelo havaiana no pé
catando garrafa latinha de alumínio
madeira de obra caixa de papelão
que é o jeito que eu tenho de ganhar essa vida.
O resto você pode fazer o que quiser
que seja o que for pra mim não tem diferença.

Júlio Versolato

Esboço


(Vidas em Preto e Branco)

no trapézio
pernas bambas
de crayon

avesso de
uma chegada

ponto de fuga
infinito
horizonte
aaaaadeslocado

vidas que
se escoram
nas sobras

sombras
da existência

Silvio J. Pedro

Desesperança



Onde estão seus sonhos?
Cadê a esperança?
Relógio descansa.
Sobre chinelos cansados
E os olhos parados a
Marcar o tempo.
Agoniza na tristeza
E na falta de fé,
Desnuda a alma,
Desfalece o corpo,
Já sem esperança
Só espera morrer.

Sueli R. S. Simão

(sem título)


Recolher os restos,
As sobras do progresso,
Migalhas da grandeza
Não foram para baixo do tapete,
Tanto incomodam agora.
E sempre, e sempre, e sempre

Roupas que outros corpos vestiram,
Sapatos de outros pés,
Cigarros de outras bocas,
Governos de países distantes
Se mostram na parede.
E sempre, e sempre, e sempre

A vida vai passando.
Vai o dia, vem a polícia.
Vai a noite, vem a fome.
Vão os carros, vem o frio.
Amanhã tudo se repete.
E sempre, e sempre, e sempre

Os sonhos, todos eles,
Vão dentro da carroça,
Que vazia está.
Sempre, sempre, sempre, sempre

Airton Mendes

Trilhas



Um eixo entre as pernas
Permeia a vida e os sonhos
Suplantados na infância, os carrinhos de rolemã...
Quando os passos bambeiam como rodas frouxas
E dinamitam os trilhos
Maceram as flores
Agonizam os sóis de abril

Claudia Sarro

In memoriam



Na pele o pó preto
Pigmento vincado
A fuligem
O veneno
As vértebras
Tudo intacto
E no osso a ferida exposta
O tambor batendo, chamando, chamando
Ogum
Agogô
Archote
Um estampido surdo no ouvido
O moleque...
E a boca inerte
Suplicando em réplicas
A canção ancestral

Claudia Sarro